Em 1985, consegui entrar em Cuba com uma câmera de video por cerca de
10 dias. Foi difícil. Antes de tudo, não era comum, como hoje, equipes
de televisão fazerem reportagens fora do Brasil. Os voos eram ralos, as
passagens caras e os equipamentos igualmente caros e muito pesados.
Éramos três: eu, Toniko Melo (na câmera) e Flávio de Carvalho (no
áudio). Fomos saudados como a primeira equipe de TV brasileira a entrar
na ilha de Fidel com liberdade. Quer dizer… quase isso: a “liberdade”
era controlada o tempo todo por um agente do governo cubano. Logo na
primeira vez que ligamos a câmera (início do video acima) coloquei
Alejandro, do Instituto de Turismo, e Domingues, o simpático motorista
do carro estatal, para mostrarem suas caras e falarem frente à câmera.
Reparem a surpresa deles, não contavam com essa “participação”. Acabei
ganhando uma relativa confiança dos rapazes. Nos dias seguintes gravamos
coisas que nunca haviam aparecido na TV brasileira como por exemplo:
gente falando ao microfone na rua!
Graças à irresponsabilidade dos meus vinte e poucos anos, só percebi
mais tarde o risco que corremos. É difícil dizer em poucas palavras o
que significa estar num país onde não existe a liberdade de expressão ou
o acesso à informação. É impossível descrever a você, que vive na era
da informação aberta e total, a sensação de acordar num hotel e
encontrar um único jornal para ler, com uma opinião e comando único: a
vontade de um ditador.
Quando visitei Cuba em 1985, o Brasil saía de uma ditadura e buscava o
mais elementar dos direitos: o voto para presidente, o que foi
conseguido em 1989 com muita luta no Congresso e nas ruas. Trinta anos
depois, triste é constatar que a situação na ilha de Fidel é a mesma. Ou
mudou?
A visita da célebre blogueira Yoani Sánchez ao Brasil me fez assistir
esse vídeo numa nova perspectiva. A jornalista, de 37 anos, é formada
em filosofia pela Universidade de Havana. Em 2002, Yoani saiu de Cuba e,
desobedecendo o governo cubano que permite uma ausência máxima de 11
meses do país, passou uma temporada de dois anos na Suíça, onde
descobriu o computador.
Na volta, para ser aceita em seu país, teve de entregar o passaporte. A partir de 2007, começou a escrever um blog, o Generación Y, traduzido hoje em 20 línguas.
Em 2008, a revista TIME incluiu Yoani na lista das “100
pessoas mais influentes do mundo” e deu muitas entrevistas a veículos
estrangeiros. A ditadura cubana reagiu implementando um sistema que
impede o blog de Yoani de ser acessado no país. Em 2011, o blog foi
liberado. Em 2012, Yoani foi detida com seu marido, por 30 horas, por
“tumultuar o julgamento” de um dissidente do regime de Fidel.
Torço para que a visita dela ao Brasil represente algum avanço na
precária liberdade de expressão em Cuba. Bem-vinda Yoani! Que sua
visita, mais que a polarização de prós e contras, signifique a
convivência de quem pensa diferente. Tanto no Brasil como em Cuba.
La lucha continua!