sábado, 18 de fevereiro de 2012

Manisfesto contra o acordo ortográfico

Desde quando os debates sobre o acordo ortográfico vieram a público no Brasil, senti-me constrangido com tal mudança. Durante todo o período escolar, esforcei-me para decorar todas as regras de nosso idioma, para agora, sem nenhum motivo, elas serem alteradas. Alterações cuja obrigatoriedade após 2012 deixa-me ainda mais constrangido. Vejo em Portugal, Angola, Moçambique e outras nações que compartilham esta loucura movimentos contrários ao Acordo Ortográfico. Mas tal movimento não existe no Brasil.
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Última flor do Lácio, inculta e bela… Espere… Inculta? Camões, Machado de Assis, Eça de Queirós e tantos outros discordariam de Olavo Bilac… Que seja! Que seja inculta, criticada, menosprezada, mas não violada! Como pode um país que supostamente apóia a democracia querer impor sua vontade a outros tantos somente por ter maior número de habitantes? E impor tal vontade maculando o maior patrimônio cultural que eles têm?
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Vejo meu idioma ser maculado por conta de meros interesses comerciais. Para que afinal serve essa suposta unificação que nada unifica? Não sou português. Nasci no Brasil e falo o idioma brasileiro. Meu idioma é tão diferente do português quanto do romeno. Não é apenas um sotaque ou um dialeto. Falo outro idioma, com outra estrutura e outras palavras, ainda que tenha nascido diretamente do português. Não falo como um angolano, não moro em Moçambique, não conheço ninguém em Goa tampouco visitei o Timor Leste. Entretanto sei que em cada um desses lugares outras línguas surgiram a partir do português, tanto como este surgiu do latim.
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Não creiam, caros amigos de Portugal, que o povo de meu país se importará com o que acontece a um de nossos maiores valores, que é nosso idioma. E há motivos para tanto. Sabiam que 14 milhões dos que aqui vivem são analfabetos? Sim, temos mais analfabetos do que vocês têm habitantes. E três milhões de crianças fora da escola. A elite tratou de emburrecer a população, de privá-la de cultura e de acesso à informação, de controlar as massas através de políticas públicas cujo único objetivo fora criar o que por aqui chamados de currais eleitorais. Por total desconhecimento do valor de sua língua, a população daqui não se manifestará contrária a violentá-la.
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Como filósofo, tenho ciência de que o maior instrumento que possuo é este idioma. E tenho ciência também de que ele é o mais perfeito para se fazer Filosofia. Sua estrutura gramatical singular permite transpor os obstáculos encontrados entre a mente e o papel, dando ao escritor a habilidade única de com as mesmas palavras expressar de forma direta e precisa seus conceitos, mantendo ainda a obscuridade da ambigüidade poética que somente é desvelada pela perspicácia de cada leitor.
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Por aqui, sigo com minha postura em recusar usar a nova ortografia e por isso, as pessoas me vêem sem circunflexos em seus hiatos, zombando de minha ingenuidade. Ninguém pára para refletir sobre meu lado, pois não têm agudos em suas homógrafas. E se a língua pôde perder esses acentos, por que não pode perder os demais? Não! Minhas idéias continuam com acento e estou disposto a pagar cada trema das conseqüências de minha escolha.
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Companheiros de Portugal, rogo-lhes que não ajam como os deste lado do Atlântico. Dêem valor ao idioma português. Lutem por sua preservação. Abracem a língua portuguesa, a mãe de meu idioma, que é o brasileiro. Não deixem que a maltratem tal como feriram a minha. Não permitam que as insanas mudanças que forçaram a população daqui a seguir sejam impostas a vocês também.
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Pedro Figueira, (Brasil)