domingo, 19 de junho de 2011

Galo "véio"

Sou do tempo em que possuir um galinheiro no quintal era privilégio de muitos. Era lá que junto com minha mãe apanhava os ovos. Ingredientes indispensáveis ao nosso cardápio, desde o simples frito até os elaborados quitutes para os dias de festa. Sem falar das penosas que aos domingos resolviam rechear nossa panela acompanhadas de polenta e salada verde da horta conduzida pelas mãos de meu pai. Lembro-me de quão significativa foi a passagem daquele galinheiro em minha vida, pois além de auxiliar na nutrição de  nossa sobrevivência, preencheu minhas necessidades de jovem observador.

Ficava longo tempo de olho no comportamento daqueles bípedes emplumados. Eram dezenas de galinhas, muitos pintos e um galo que passava o dia perseguindo suas donzelas. Admirava-me com a insistência e falta de critério ao efetuar suas escolhas. Se a carijó lhe chamava à atenção, de pronto lá estava o "galo véio" a perseguí-la. Matava as bichinhas no cansaço. Eram voltas e mais voltas até consumar o ato.

Passaram os anos, vieram os supermercados e os galinheiros tornaram-se nostálgicas lembranças que vez por outra passo a invocar. Principalmente quando estou em meio ao dito progresso dos dias atuais e observo as pessoas correndo de um lado para o outro, imagino-as procurando seu milho de cada dia. Sem me esquecer daquelas com os pintinhos embaixo das asas que se desviam dos obstáculos oferecidos pelo nosso modo urbano de viver. E o galo véio, cadê ele, indago-me!

E por incrível coincidência era meu tio. Sim, meu simpático e adorável parente carregava a sina daquele bípede que tanto mexeu com minha imaginação lá naqueles tempos de guri. A insistência e falta de critério na escolha das namoradas levaram-me fatalmente a comparação. Não há como negar que o homem era um verdadeiro "galo", pois diariamente rodava as praças da vida a cata de suas almejadas musas. Encontrava numa esquina, largava na outra e partia para novo ataque. Pouco importava a altura, cor dos olhos, religião, profissão, idade ou cor, inclusive era aplicado amante entre as deficientes físicas de muletas, cadeiras de roda, cegas, etc. Chamou... lá estava ele.

Certo dia, contaminado pelas minhas observações, disse-lhe: - E aí galo véio, e as gatas! Como resposta recebi um tapa na orelha de zunir o ouvido e um comentário curto e grosso: -Respeita teu tio, piá de merda! Enquanto me recuperava da tontura, lembrei-me do belo ensopado que aquele velho reprodutor de galinhas transformou-se... Fica o registro de saudade de um tio que muitas marcas em minha vida deixou.

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