quinta-feira, 30 de junho de 2011

Minha gata

Todos na sala, a balbúrdia correndo solta, típica de jovens adolescentes antes de a professora chegar. De repente o silêncio geral, chega, deposita o material sobre a carteira e mesmo antes da chamada, comunica-lhes que hoje escolheria alguns alunos para a leitura da produção textual solicitada na semana anterior. Fui o primeiro da lista, peguei o caderno e:

"-- O dia de natal é para mim um dia muito especial, não porque é natal, mas porque lembro da minha gata de estimação. Encontrei-a na rua, em um terreno baldio, após ouvir seus miados de desespero, instante em que não pensei duas vezes, segui meu instinto protetor e levei-a para casa. Minha mãe detestava qualquer tipo de bicho, assim tive que tratar da minha gata de maneira a não ser percebido. Com uma caixa de papelão fiz a casa da xereta cujo nome veio-me porque a bichana cheirava e se intrometia em tudo.

Passados alguns dias, o inesperado aconteceu, acordei com a mama derrubando tudo dentro do meu quarto, querendo tirar aquele animal dali. A xereta havia fugido do porão e foi parar em meu quarto. Adorei aquilo, pois ela já percebia que eu existia, pensei. Enquanto isso, a mãe com a vassoura tentando acertá-la e nada. Nossa! como era ágil e esperta; pulava daqui e dali, subia pelas paredes, corria por baixo da cama sem ser atingida. A mãe parou quando falei que era minha. Somente orientou-me a não trazê-la  para dentro de casa, claro que concordei, no entanto o tempo iria mostrar que essa tarefa seria quase impossível.

Minha companheira em vários momentos, enroscando-se em mim, pedindo carinho ou comida, sentia-me muito importante porque ela precisava da minha atenção. Fomos levando nossas vidas, até que o lado maternal da minha gata surgiu, e lá aparece com um barrigão, minha mãe soltou o verbo, disse-me que eu teria que dar um jeito nos filhotes quando nascessem. Inicialmente não me incomodei, só queria curtir no momento em que os rebentos viessem ao mundo. E vieram, quatro crias, três machos e uma fêmea, consegui encontrar donos para os machos. Aí entendi porque a encontrei na rua, ninguém queria gatinha e como sempre aprendi rápido, fui ao mesmo local onde encontrei-a e deixei sua filha.

Essas e outras aventuras só foram possíveis porque tinha uma companheira e tanto, muito linda, toda malhada, tinha manchas de todos os tipos de pêlos - branco, amarelo, preto, cinza e outras tonalidades que não sei explicar. Era cheia de manias que eu adorava. À noite vinha à janela de meu quarto e parecendo entender que minha mãe não a queria dentro de casa, ficava rosnando bem baixinho, pedindo para entrar. Eu abria uma fresta e em dois pulos a bichana se acomodava junto aos meus pés e assim nos aquecíamos nas noites de inverno da serra gaúcha.Quando estávamos na cozinha, ela ficava em uma janela pelo lado de fora, só acompanhando nossa movimentação, sabia que dali sairia o seu jantar. Pela basculante jogava-lhe pedaços de carne, pão, queijo entre outros petiscos. Além de brincalhona era muito curiosa, vivia xeretando tudo, qualquer novidade lá estava querendo descobrir para que serviria aquilo.

Assim foi quando viu a árvore de natal, toda colorida, cheia de enfeites pendurados e não resistiu. Começou a bater nas bolinhas e olhar admirada os movimentos. Eu  observando, na verdade curtia com ela aquela descoberta. Estávamos nos divertindo, quando aos gritos chegou minha mãe que ao vê-la "destruindo" a árvore, não pensou duas vezes, juntou a primeira coisa que lhe veio às mãos e zás... atirou uma garrafa que acertou-a em cheio. Tudo para o chão, e lá no meio da bagunça a xereta aquietou-se, sem movimento algum, dera seu último suspiro. Esse foi o meu Natal inesquecível." ... FIM.

Após a leitura, enquanto a professora tecia alguns comentários, comecei a suar, meu coração disparou deixando-me paralisado. É que às vezes pedia o caderno para anotações ou apor o visto, eu desejando o contrário. Pois, avesso à minha prática, naquele dia não fiz a lição, em minhas mãos somente um caderno aberto com as folhas em branco, a professora pegara-me de surpresa e eu acabara de ler as marcas de minha existência. Ufa!

3 comentários:

  1. Essa amor pelos bichanos indefesos é o verdadeiro amor sem nennhuma pretensão!!!

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  2. Não acredito que esse foi o fim da gatinha...=(
    Adrielle

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  3. Oh, pobre gatinha!!! Dantes, fazia-se muito isso com as gatas. Hoje em dia, felizmente já não tanto, porque já se fazem esterilizações. Tenho 2 gatas e 1 gato, e ainda só não esterelizei a mais pequena, com 1 ano.
    Beijinhos,
    Madalena
    P.S. Espero que agora tenha gatinhos seus!

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