domingo, 24 de julho de 2011

Um domingo

Aos domingos, após o almoço, retirava-se para o pátio e iniciava-se a diversão. Em frente à porta da cozinha, construía sua cidade com rios, estradas e casas de barro onde colocava os bonequinhos. Era bom ser o arquiteto, o prefeito e o morador. Via-se pilotando um carrinho ou montando um cavalo e pocotó... pocotó... em busca de aventuras.

Às vezes, algum distraído saía pela porta e dava com os pés naquelas construções. Era uma catástrofe que não o abalava, tão logo refeito do susto, reerguia nos mínimos detalhes. Tinha a igreja, o colégio, a biblioteca, as casas dos amigos, as ruas, estradas que levavam aos locais turísticos e a zona rural, tudo de acordo com o que vira na cidade grande. Cada personagem em suas respectivas atividades, às da cidade em seus empregos e repartições e as outras com suas criações e lavouras. Era seu exercício dominical de criador. Era aquilo que sua vontade determinava.

Após algum tempo, começou a roncar-lhe a barriga, sinal de que era a hora do recreio. Correu para o quarto, pegou uma atiradeira encheu o pequeno bornal e transformou-se em caçador. Precisava abater uma presa para preparar a refeição. Iniciou a caçada na velha figueira que era parada obrigatória dos pássaros da região. No íntimo, acreditava que nunca iria acertar em nada, pois era muito ruim de pontaria, mesmo assim valia pela aventura de estar batalhando pela sobrevivência.

Após várias tentativas, as mãos já doloridas de tanto esticar a borracha, viu um pardal aproximar-se saltitando de galho em galho, bicando os figos maduros. Era uma cena corriqueira ver aves no quintal, mas hoje tornou-se especial. Pois, aquela era a caça e seria seu sanduíche. Assim, pegou a última pedra, uma pequenina, ajeitou na atiradeira, esticou e ficou mirando para encontrar o melhor ângulo. Após alguns segundos de espera e determinação Zum... bem na mosca, viu algumas penas voarem e a caça cair.

E quem despencou também foi o garoto, pois não acreditava que seria capaz de tamanho absurdo. Aproximou-se e viu o pardal inerte no solo, aquela imagem lhe atingiu em cheio o coração, não desejava aquilo, só estava brincando e a brincadeira agora estava lhe machucando. Doía-lhe a alma e a angústia invadiu-lhe.

Em completo pânico, torcendo para ninguém presenciar a tragédia, pegou os restos mortais e colocou-os na caixinha de jóias de sua mãe - era o mínimo que poderia fazer, pensou. Dirigiu-se ao canto mais florido do jardim e lá realizou o sepultamento da vítima de seu doloroso ato.

Naquele instante lágrimas rolaram. Com tristeza e culpa em seu coração, marcou o local com uma pedra. Foi para casa, já que o café estava na mesa, era pão com margarina... ele adorava, mas naquela tarde a fome o abandonara...

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